quinta-feira, 2 de junho de 2011

CAUSAS ANTIGAS DA VIOLÊNCIA NO CAMPO


EDITORIAL O GLOBO, 01/06/2011

Do chamado massacre de Carajás, em 1996, até agora, foram 212 pessoas assassinadas na região de Marabá (PA) devido a conflitos agrários, pelos dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Mesmo que haja alguma superestimativa nos números, por motivos políticos, fica comprovada a gravidade da violência naquela região do Pará.

A morte há dias do casal José Cláudio e Maria do Espírito Santo, tudo indica por denunciarem desmatamentos ilegais, é a mais recente contribuição a esta estatística macabra. Na manhã de ontem, a ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, recebeu da direção da CPT a relação de 1.855 pessoas sob a mira de madeireiras, desmatadores, etc. Como ocorre nessas situações, o assassinato do casal levou a uma grande mobilização de ministros e autoridades em geral, para conter a escalada da violência. Mas Rosário foi direta, na reunião de ontem: não há como o governo garantir a segurança de todos. Compromete-se a cuidar dos casos mais graves. Mas como garantir que alguém que recebeu apenas uma ameaça não será alvejado antes de outros mais visados?

O Estado não pode proteger todos, como não atendeu aos pedidos sucessivos de ajuda do casal José e Maria. Muitos sabiam, inclusive agentes públicos, que o casal estava marcado para morrer. Temos aqui mais uma demonstração cabal de que o Estado brasileiro é débil onde deveria ser forte - na segurança, no caso - e opressivo onde não é necessário - por exemplo, na expropriação tributária.

A coreografia encenada em Brasília é conhecida. É a mesma de vezes anteriores. Foi assim na morte de Chico Mendes, em 1988, em Xapuri (AC). Também na da freira missionária americana Dorothy Stang, em 2005, em Anapu (PA). A Polícia Federal e a Força Nacional são acionadas, promotores e procuradores se agitam, mas o tempo passa, o aparato é desmobilizado, até voltar a vigorar a lei do gatilho.

É de fato difícil montar um sistema amplo de segurança pública em regiões tão distantes das capitais e tão extensas, embora seja imperdoável o imobilismo do poder público em casos como o do casal assassinado há pouco. Agrava, ainda, o quadro de violência ela se alimentar de distorções que vêm de longe.

Há a questão da titularidade da terra, mas existem também erros crassos na colonização da Amazônia, cometidos desde a ditadura militar. Um dos resultados é que assentamentos de reforma agrária, do Incra, tornam-se vetores da destruição da floresta, por mais que o governo do PT, por razões políticas, queira omitir o fato. Sem alternativa de sobrevivência, só resta a assentados derrubar árvores.

Reportagem publicada domingo no GLOBO, feita na dinâmica fronteira de desmatamento de Mato Grosso, é didática: enquanto não se tornar a floresta mais rentável em pé do que transformada em toras, carvão e espaço para pasto, conter a derrubada será luta inglória ou quase isso. Claro que muito falta a ser feito na repressão e vigilância.

Mas é crucial haver um sistema de exploração racional da floresta que gere renda e emprego para quem vive naquelas imensidões, sem precisar da motosserra.
E há conhecimento técnico disponível para tal.

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