sábado, 28 de maio de 2011

CÓDIGO CRIMINOSO


Carlos José Marques, diretor editorial - revista Isto É, N° Edição: 2168, 27.Mai.11

Tombaram assassinados na semana passada os extrativistas José Cláudio Ribeiro e Maria do Espírito Santo, que combatiam o desmatamento desenfreado e ilegal na região do Pará, onde moravam. Sinal dramático da derrota gradativa da causa ambientalista, que vem apanhando até no Legislativo, a morte do casal ocorreu coincidentemente no mesmo dia em que deputados votaram e aprovaram o novo Código Florestal cujo teor é claramente favorável aos interesses ruralistas. Os madeireiros são os principais suspeitos da emboscada que vitimou José e Maria. São também os maiores beneficiários do novo código que saiu da Câmara.

O mundo sublinhou que “destruidores da floresta” venceram mais uma vez. Em duas frentes. Eliminando adversários – tal e qual ocorreu com o líder seringueiro Chico Mendes, anos atrás – e legalizando décadas de abate ambiental.

Como afronta à preocupação do planeta com a preservação do meio, o código prevê, inexplicavelmente, anistia geral e irrestrita aos devastadores da Amazônia que praticaram o crime até 2008. Uma aberração! Milhares de hectares de árvores foram sistematicamente derrubados para exploração comercial, sem nenhuma fiscalização, deixando a céu aberto amplos clarões no cinturão verde do País. O corte irresponsável e a queima de matas constituem hoje um dos maiores desastres globais e o Brasil, em vários Estados, lidera as estatísticas desse atentado ecológico.

Um documento explosivo entregue ao governo federal por autoridades de Mato Grosso mostra que nos meses de março e abril – portanto às vésperas da aprovação do código – houve um aumento do ritmo de desmatamento em quase 500% sobre o mesmo período do ano passado.

A certeza da impunidade e do perdão que viria a seguir teria levado ao quadro de tragédia. Quase em simultâneo, José e Maria faziam uma persistente campanha alertando para o problema e denunciavam que estavam sendo ameaçados de morte pela ousadia de encarar o lobby madeireiro.

O poder constituído fechou os olhos aos dois crimes. O destino dos ambientalistas foi selado. Políticos movidos por interesses econômicos específi cos – eles mesmos proprietários de terras, como revelou ISTOÉ em sua edição de número 2165 – impuseram uma derrota fragorosa ao governo Dilma e com a canetada a favor do código sacramentaram a exploração desenfreada do meio ambiente.

Por leniência, descaso e até mesmo conivência dos que podiam fazer alguma coisa e não o fizeram, José, Maria e milhares de árvores foram abatidos. A presidente Dilma, irritada com o desfecho, vai brigar para reverter o processo. Ameaçou vetar o código, exigiu o fim da anistia aos desmatadores e o estabelecimento de áreas de proteção da vegetação nativa nas propriedades rurais e nas margens de rios e encostas.

Ainda há uma esperança de que as mortes de José e Maria não tenham sido em vão.

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