segunda-feira, 16 de maio de 2011

NUM MATO SEM CACHORRO

Nossos deputados federais e senadores estão perdidos. Embrenharam-se na mata e não conseguem achar uma saída. E não é de hoje. Faz quase três anos que o país espera que os parlamentares se entendam e escrevam a versão definitiva da lei que terá como nobre finalidade a fixação dos limites e parâmetros de convivência entre ambientalistas e ruralistas. Isso importa a todos. Quem é da cidade depende dos produtos do campo. No meio rural ou nas grandes cidades, queremos terra, água e ar saudáveis. Se a atividade dos agricultores degrada rios e suas margens, se estamos ameaçados por deslizamentos de terra nas barrancas desprovidas de vegetação protetora, se o regime das chuvas se altera tanto quanto o homem intervém no ecossistema, então precisamos de legislação muito clara para estabelecer restrições que visem à preservação, sem impedir o proveito econômico do uso das propriedades.

Um dos temas ainda não pacificados é o da restauração das áreas prejudicadas. Quem suportará o custo das reposições necessárias? Não se pode ignorar a dureza da atividade rural, sua dependência dos financiamentos, as agruras que ora a chuva, ora a seca, provocam. São questões não resolvidas. O único consenso alcançado foi negativo. O relatório, que já ganhou várias versões, desagradou a todos. E já se está ingressando em um clima constrangedor. Do descontentamento, alguns passaram ao rancor, do debate forte, chegaram às ofensas. E a votação foi outra vez retardada, não se sabe para quando, pois nesta semana será impossível avançar, ante a viagem ao Exterior de líderes partidários e do presidente da Câmara Federal. O Senado cansou de ficar na espera e por lá se vai desenhando outra proposta. Sabe-se, então, que o texto aprovado em uma casa vai à outra para ser modificado e depois voltar, como é do processo legislativo. As safras que esperem, os rios e as matas que suportem o descontrole.

A sociedade aumenta a descrença em seus representantes nessas horas. Em nome da governabilidade, situação e oposição se confundem, todo mundo vira governo. Vê-se, agora, que há interesses que quebram essa harmonia. E de um jeito irreparável, ou pelo menos de muita dificuldade para uma reconstrução que favoreça o cumprimento do dever de legislar. Ao fim, vem por aí um monstrengo jurídico que ensejará novas demandas na Justiça. Queixosos do que chamam de ativismo judicial, deputados e senadores reclamam do espaço que o Supremo Tribunal Federal tem preenchido ante a inércia dos legisladores. Reclamação improcedente. Menos mal que o STF cumpre o que lhe cabe e aperfeiçoe o que vem das leis. Por ora, não temos o Código Florestal, que vai demorar. Sem ele, também nós ficaremos na selva, sem bússola e sem cachorro. Perdidos.

CLAUDIO BRITO, JORNALISTA - ZERO HORA 16/05/2011

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